Uma das coisas mais legais de acompanhar Bleach é o fato do autor inserir vários elementos os quais dão dicas sobre os poderes de um personagem ou os rumos da série, tal prática é conhecida como foreshadowing (presságio).
Foreshadowing é um artificio literário pelo qual um autor insinua fragmentos da história que ainda está por vir. É uma espécie de “truque narrativo” no qual um elemento é colocado em cena de maneira que o público não o decifre de imediato, e sua volta posteriormente abala a trama de maneira significativa.
Eiichiro Oda, autor de One Piece, é conhecido por inserir vários foreshadowings no mangá, porém um outro autor do Big Three também faz isso, Tite Kubo. Em Bleach, há vários elementos visuais “escondidos”, de modo que alguns ainda estão sendo descobertos atualmente e outros já descobertos geram debates ou criam teorias.
O maior foreshadowing da série foi a revelação de que o lado white (hollow) de Ichigo Kurosaki é o verdadeiro Zangetsu, sendo a origem dos poderes shinigami dele, ao passo que o homem barbudo o qual se acreditava ser o Zangetsu era na verdade a manifestação dos poderes quincy do protagonista. As dicas dessa revelação são traçadas desde o começo do arco Soul Society.
Outra grande foreshadowing debatido é que a Soul Society tinha planos originais de tornar Ichigo o próximo Rei das Almas e que o próprio rei não passava de uma mera “casca”.
Todavia, o presente texto não irá focar nessas duas revelações, pois merecem um texto à parte, mas sim nas demais dicas que a maioria dos fãs passa desapercebido. Vale lembrar que os dois textos que escrevi, sobre as lutas do Ichigo contra Byakuya e contra Ulquiorra contém outros detalhes que foram expostos lá.
Neste texto não será discutido somente presságios, como também cenas paralelas e pequenos detalhes visuais que valem a pena citar.
Na famosa cena de confissão da Orihime, ela comenta seus sonhos e desejos antes de se despedir do Ichigo. No decorrer do mangá, ela acaba realizando parte destes sonhos, pois chegou a trabalhar em uma loja de bolos/padaria, comeu todos os donuts (pelo menos da caixa traga pela Riruka) e o mais importante, acabou ficando junto com a pessoa que amava. Então pode-se dizer que Orihime completou uma das cinco vidas a qual ela desejou ter.
Falando em Orihime, em tese, Kazui não é o primeiro “filho” dela com Ichigo, pois no capítulo 43, uma das fadas do Shun Shun Rikka explica a Inoue que foi graças ao Kurosaki que eles nasceram.
Bleach começa com Ichigo tornando-se shinigami após Rukia emprestar seus poderes a ele. Por esta razão que a guarda da espada do protagonista no começo é idêntica a guarda da espada de Rukia mostrada no capítulo 269.
Quando estava prestes a ser morto por um capanga do Nnoitora, Ichigo é salvo por Kenpachi, que chega a fazer um comentário ironizando a situação. No último arco, as posições se invertem e Zaraki é quem está caído no chão perto de ser morto, até ser salvo por Kurosaki, que chega a brincar com a situação.
No flashback dos vaizards, quando Aizen era vice capitão, ele trai seu capitão Shinji. Um século depois, foi a vez do seu “tenente”, Gin Ichimaru, trair o Aizen.
Na verdade, Aizen é traído duas vezes, pois em um diálogo, ele comenta que confiança e fé são para os fracos e ele não as possui. Todavia, é traído pelo Hogyuoku, do qual ele tanto confiou e acreditou. Isso é karma.
Quando os personagens do Kenpachi e Gin são apresentados, Zaraki conversa com Ichimaru como que ele e o Tousen são os únicos capitães do Gotei 13 que têm medo da morte. Isso foi um presságio da obra em dizer que estes dois irão trair a Soul Society para se aliar a Aizen.
Um dos presságios mais famosos da obra foi quando Shinji Hirako se apresentou na classe de Ichigo, ele escreveu seu nome ao contrário. Em sua luta, foi revelado que seu poder alterar a direção dos sentidos.
Quando Aizen e sua trupe invadiu Hueco Mundo (isso antes de se rebelar contra Soul Society), Baraggan era o rei do castelo de Las Noches, mas Tousen chega a indagar como Las Noches seria um castelo se não têm paredes ou teto. O hollow responde que não há paredes ou teto porque tudo ao redor lhe pertence, inclusive o céu, além disso, no poema de seu volume, ele ainda comentar que “a noite é o meu servo”.
Então, quando Aizen tomou conta de Las Noches, fez questão de fazer um castelo e incluir um céu azulado em seu interior, a fim de humilhar o Baraggan e jogar sal na ferida de um rei que perdeu a sua coroa.
Um shinigami tentou levar Orihime para o quarto, mas interrompido por Ishida. Acontece que este mesmo oficial aparece novamente no capítulo 511 e é assassinado pelos quincies.
É largamente sabido que Tite Kubo se dedica a desenhar os figurinos dos personagens, tanto que nos textos que escrevi dedico a comentar sobre a vestimenta dos personagens em alguns momentos. O que é pouco comentado é que Kubo fez um prenúncio acerca do gênero sexual dúbio da Giselle Gewelle na arte dos sternritters, uma vez que todos os homens têm os botões de seus uniformes de um lado e as mulheres de outro (como é de fato na vida real), porém Giselle é a única cujos botões não se sabem em qual lado da roupa foi colocado.
No capítulo 480, há um erro de tradução, porque os membros da 12ª Divisão falam em uma “categoria Sutra” para medir o nível de alerta de uma ameaça na Soul Society, porém na verdade é mencionado “Escala Shutara”, criado em referência à Senjumaru Shutara (修多羅 千手丸), um dos membros da Guarda Real.
Agora fica a dúvida de quem seria o maior cientista da história da Soul Society: Mayuri, Kisuke ou Senjumaru?
No capítulo 50, Kisuke Urahara pisa em uma mosca e quando Aizen explica, no capítulo 397, para Ichigo que ele esteve o vigiando desde o seu nascimento, a mosca reaparece em um dos quadros.
Quando Ichigo transforma-se em vasto lorde, a arte do título do capítulo mostra o Ichigo com a metade de seu corpo com na forma hollow. Na forma final da bankai do protagonista, ele está com a mesma aparência da arte do capítulo 352.
Quando Chad é socorrido pelo pai de Ichigo no capítulo 7, Isshin liga para o hospital solicitando quatro camas para os pacientes que apareceram em sua clínica. No momento, ele diz para a atendente falar para o chefe dela que é o Kurosaki que está pedindo.
Futuramente, é revelado que o pai de Uryuu, Ryuuken Ishida, é diretor do Hospital de Karakura e amigo de longa data do Isshin.
Embora ambos discutem bastante, Ichigo e Isshin são bem parecidos, seja em aparência quanto à preferência por mulheres, visto que Masaki e Orihime têm aparência e personalidade similares. Um fruto não cai muito longe da árvore.
Ichigo não é o único personagem com algum tipo de “Complexo de Edipus”, pois é bem possível que a razão pela qual Uryuu Ishida simpatizou com a Nemu é porque ela se assemelha a mãe dele, Kanae Katagiri, ainda que Nemu seja inimiga dele naquele momento.
Ambas Kanae Katagiri e Nemu Kurotsuchi são subordinadas a seus respectivos mestres, Kanae como empregada de Ryuuken e Nemu como serva/tenente de Mayuri, as duas são leais e possuem um enorme senso de dever, dado que Kanae desde sua infância dedicou sua vida a servir o pai do Ishida ao passo que Nemu se sacrifica pelo Mayuri.
Além de que ambas foram utilizadas como objeto em algum momento da obra, pois Uryuu criou um enorme ressentimento contra Ryuuken porque viu seu pai fazendo uma autópsia em Kanae (ele não sabia da verdade até então), bem como viu Nemu ser maltratada por Mayuri quando lutou contra o capitão. Logo, é seguro dizer que Ishida ajudou Nemu naquele momento porque de certa forma enxergou a mãe dele nela (não estou afirmando que há uma conotação romântica, mas que ele criou uma simpatia por ela por causa disso). Quando expus essa teoria no subreddit de Bleach, a grande maioria acabou concordando com essa hipótese.
Sobre o núcleo humano de Bleach, repare que Ichigo e seus amigos formam uma típica party de RPG, Ichigo é o guerreiro, Uryuu é o arqueiro (com visual de paladino), Sado é o tank e a Orihime é a healer. Seria o Kisuke Urahara o mestre? Pois é ele quem planeja tudo nos bastidores, “passa a missão” para os aventureiros e não ajuda na luta.
Uma das maiores (e também tristes) revelações de Bleach no último arco é que Yachiru é a zanpakutou de Kenpachi, porém a obra deixou diversas dicas no passado. No flashback do momento em que Zaraki e Yachiru se conhecem, ele pergunta de onde ela veio e a garota toca na espada, após a luta do Ichigo, Yachiru conforta Kenpachi dizendo que a luta não valeu por ter sido 2 contra 1, ela não participou da luta e a zanpakutou do Ichigo sim.
Outrossim, Yachiru é mostrada como uma péssima navegadora, levando Kenpachi para os caminhos errados, mas isso é porque Zaraki nunca ouviu sua zanpakutou de verdade.
No treinamento de Ichigo para conseguir a bankai, o “velhote” diz ao protagonista que somente a verdadeira Zangetsu é capaz de derrota-lo. Acontece que no último arco, é revelado que o velhote não era a Zangetsu, mas sim o lado hollow do Ichigo, que sempre o protegeu. Na batalha final, Yhwach é derrotado com a Zangetsu que nós conhecemos.
Na arte ilustrativa do capítulo 428, há uma “mancha” negra no topo que se assemelha bastante ao Yhwach quando ele manifesta seus poderes. Repare que a ilustração mostra todos os inimigos que Ichigo enfrentou cronologicamente, de baixo para cima, sendo que Yhwach fica na parte de cima como vilão final da obra.
Antes de Tousen morrer, Sajin conta a seu antigo amigo que tivesse perdido alguém especial como ele e escolhesse o caminho da vingança, teria um buraco em seu coração. No último arco, Sajin arranca o seu coração para atingir sua forma “humana” e ficar mais forte. A história de Tousen e Sajin merece um texto a parte, pois ambas narrativas se conectam, apresentando rumos semelhantes e resultados semelhantes.
Quando Ichigo e sua tuma invadem a Soul Society, o mecanismo de defesa da Seireitei é ativado, de modo que um dos quadros mostra uma sequência de letras na seguinte ordem “R S T C V W X Y Z A B C”. Repare que há uma letra “c” no lugar da letra “u”, deixando implícito que há algo de errado.
Ocorre que no capítulo 547, durante o último arco, foi revelado que a Wandenreich, o império quincy, esteve escondido todo esses anos nas sombras de Seireitei.
Caso tenha gostado do texto, recomendo a leituras das análises que fiz das lutas entre Ichigo e Byakuya e Ichigo e Ulquiorra. Em tais texto, faço um exame não apenas da luta visual em si, mas também de toda construção do conflito, background dos personagens envolvidos, narrativa, ideias transmitidas e linguagem visual dos quadros.